A Autoridade e a Inerrância das Escrituras Sagradas
Por Marcio S. da Rocha.
“Vocês erram porque não conhecem as Escrituras nem o poder de Deus.” (Mateus 22.29)
A Autoridade das Escrituras
A Autoridade da Bíblia é uma consequência natural de sua Inspiração. Deus nos transmitiu suas verdades e fez isto por meio de inspiração. A palavra grega para inspiração é theopneustos, que significa literalmente, “soprado por Deus”. Deus, pelo Espírito Santo, fez com que alguns homens, em várias épocas, escrevessem o que ele queria nos comunicar, para nos orientar no caminho de volta a ele mesmo. Paulo, escrevendo a Timóteo, diz: “Toda Escritura é divinamente inspirada e proveitosa para ensinar, para repreender, para corrigir, para instruir em justiça” (2 Tim. 3.16). Pedro também diz que “Nenhuma profecia da Escritura é de particular interpretação. A profecia nunca foi produzida por vontade humana, mas homens falaram movidos pelo Espírito Santo” (2 Pedro 1.20). Roy Zuck, em seu livro Interpretação Bíblica (p. 80), chama a nossa atenção para o fato de que os escritores bíblicos não eram inspirados; as palavras que eles receberam e escreveram é que foram inspiradas por Deus. Em outras palavras, os escritores bíblicos, quando eram movidos pelo Espírito Santo, escreviam as mensagens que Deus os inspirou a escrever. Os homens que escreveram os livros bíblicos foram inspirados por Deus de diversas maneiras. Uns ouviram a voz de Deus que os mandou escrever exatamente o que escreveram. Outros escreveram sobre suas experiências com Deus e os ensinamentos que aprenderam delas. Outros (como Lucas) foram inspirados a realizar uma minuciosa pesquisa histórica e relatar sistematicamente o que levantaram. Outros, como Mateus e João, registraram de memória o que viram e ouviram Jesus fazer e dizer. Alguns (como Paulo) escreveram cartas, originalmente com o propósito de orientar os primeiros cristãos na fé. Em todos os livros (com exceção dos textos ditados diretamente por Deus ou escritos pelo próprio Deus — como os 10 mandamentos), a inspiração divina não anulou a individualidade dos escritores. Portanto, a mensagem bíblica deve ser interpretada considerando o contexto histórico e cultural do escritor original e em como os receptores do livro compreenderiam a mensagem.
Assim, uma vez que temos em mãos as palavras que o próprio Deus “soprou” aos homens a quem ele quis que escrevessem sua revelação, e, pelo fato dela estar completa, ninguém pode ter sequer autoridade igual à Bíblia. Nenhuma pessoa ou instituição tem autoridade igual nem superior à das palavras do próprio Deus, com relação aos assuntos centrais nela tratados. Embora saibamos que a adequada interpretação literária da Bíblia seja necessária para a correta compreensão das verdades divinas, quem disser algo que contrarie o que Deus disse está errado (quer seja por uma oposição intencional ou por engano). A Palavra de Deus é a verdade e o que a contraria é mentira ou erro.
Além de não contradizer as Escrituras, não devemos tentar acrescentar ou diminuir nada a elas. O Cânon é de Deus. Não devemos canonizar pessoas nem qualquer outra coisa produzida pelo homem. Jesus condenou veementemente a atitude dos fariseus, pois eles, em nome de Deus, igualavam a tradição e certos costumes religiosos deles às Escrituras. Jesus disse que com isso, eles não estavam simplesmente diminuindo a força da Palavra de Deus. Jesus disse muito claramente que os fariseus estavam, na realidade, anulando a Palavra de Deus (Mat. 15.6). Em outras palavras, ao considerar suas tradições e costumes no mesmo nível de autoridade das Escrituras, os fariseus estavam tornando a Palavra de Deus inútil para o que ela se propõe. Isto é muito sério. Quem fizer isto hoje em dia, mesmo que seja “em nome de Cristo”, estará reproduzindo o mesmo erro dos fariseus; está reprovado por Jesus do mesmo jeito que os fariseus o foram. A Bíblia veio de Deus (por meio de homens); as tradições e costumes vieram somente dos homens. Mesmo as tradições e costumes da igreja são coisas de homens e igualá-las em autoridade à revelação de Deus é um erro sério.
A Bíblia é a autoridade final para os que são do Senhor, em termos de fé e prática, de doutrina e liturgia, de crenças e ações. É o padrão pelo qual o cristão analisa e julga tudo que se diz sobre Deus, sobre a origem da vida, sobre a essência da alma humana, sobre o relacionamento entre Deus e a humanidade e sobre o seu futuro final.
A Inerrância das Escrituras
A Inerrância das Escrituras é uma doutrina do século XX que afirma que os manuscritos originais – os autógrafos, escritos pelas próprias mãos dos escritores bíblicos – não continham nenhum erro (teológico, textual, histórico ou científico). Por esta doutrina, o mesmo não pode ser dito com relação às cópias manuscritas das Escrituras que foram sendo produzidas ao longo dos séculos, até a invenção da imprensa. Algumas dessas cópias (de livros do Novo Testamento) contêm alguns erros e muitos versos trazem leituras variantes, quando comparados entre si. Isto não significa que Deus não preservou a sua palavra. A Preservação das Escrituras Sagradas é estudada em outro post neste website, mas, aqui, voltemos à questão da inerrância. A lógica da doutrina da Inerrância da Bíblia é a seguinte: Se Deus não erra, então comunicou com perfeição a sua mensagem e garantiu que os escritores bíblicos a registrassem sem erro, mesmo que eles mesmos não a entendessem em sua plenitude. Os postuladores e defensores desta doutrina citam Davi: “A lei do Senhor é perfeita, e refrigera a alma; o testemunho do Senhor é fiel, e dá sabedoria aos simples. (Slm. 19.7).
É possível que os manuscritos originais tenham sido escritos pelos profetas e apóstolos sem qualquer tipo de erro; porém, esses autógrafos não estão mais à nossa disposição hoje. Sabemos que as cópias manuscritas mais antigas dos livros bíblicos que dispomos hoje (nos museus da Europa, Israel e Estados Unidos) e que servem de base para muitas edições das Bíblias modernas possuem alguns (poucos) erros de nomes de pessoas, lugares e fatos históricos, mas pode ser que tenham ocorrido apenas nas cópias (escritas á mão) e não nos originais. Antigos líderes da igreja nos primeiros quatro séculos (tais como Orígenes, Jerônimo e Agostinho) afirmaram que alguns erros existiam apenas nas cópias “menos acuradas”. Por outro lado, é possível que alguns escritores bíblicos do Novo Testamento tenham escrito erroneamente alguns nomes de pessoas do Antigo Testamento, alguns nomes de lugares geográficos, e pequenos detalhes de certos fatos históricos. Isto não anula a inspiração divina, uma vez que a Bíblia não foi escrita principalmente para ser um livro científico, histórico ou geográfico. Seu propósito principal é revelar Deus, a essência do ser humano, a origem e o destino da vida em geral. Neste aspecto principal, os livros bíblicos são inerrantes e verdadeiros.
A esta altura, é importante definir o que é a verdade. Verdade é uma afirmação que corresponde aos fatos. Quando dizemos que as Escrituras são verdadeiras quanto ao seu propósito principal, afirmamos que tudo o que ela diz referente à Deus, à essência do ser humano, à origem da vida e seu destino final corresponde aos fatos, mesmo que, para se comunicar com o homem finito, o Deus Eterno tenha usado linguagem humana, sensorial, figurada ou poética. Quando alguém hoje em dia diz que vai ver o pôr do sol, está se expressando numa linguagem sensorial, e ninguém interpreta que essa pessoa não saiba que é a terra que gira em torno do sol e não o contrário.
Sobretudo, deve-se ter cuidado com aos alegados “erros científicos, históricos e geográficos” na Bíblia. A maioria deles não consistem realmente em erros, mas são resultantes de interpretações erradas de leitores, principalmente de opositores da fé cristã. Em geral, a Bíblia é bastante acurada quando cita fatos históricos e lugares geográficos, e é impressionantemente correta quando revela conhecimentos científicos na área da física, da biologia e da química que foram descobertos pelo homem somente milhares de anos depois.
Cremos que a supervisão do Espírito Santo garantiu que os escritores bíblicos escreveram o que Deus inspirou (em alguns casos, exatamente o que Deus escreveu ou falou), embora Deus tenha respeitado a cultura e a personalidade de cada escritor. Deus não anulou a humanidade dos escritores bíblicos; ele escreveu por meio delas. Assim como Jesus era, ao mesmo tempo, divino e humano quando encarnado, a Bíblia também é, ao mesmo tempo, divina e humana.
A questão das supostas contradições
Deus não se contradiz. Se ele supervisionou os escritos da Bíblia, ela é harmônica e coerente. Muitas supostas contradições, são de fato, diferenças e não divergências. Por exemplo, muitos relatos nos quatro diferentes Evangelhos se complementam; não se contradizem. Teólogos conservadores e apologistas cristãos têm respondido sabiamente a muitas supostas contradições bíblicas apontadas por ateus e teólogos liberais. Mesmo assim, novas “contradições” são levantadas continuamente.
As supostas contradições bíblicas são geradas, em sua grande maioria, por um ou mais dos seguintes motivos: (1) falta de conhecimento das regras de interpretação bíblica e/ou falta de maior leitura bíblica; (2) cegueira espiritual dos “não nascidos de novo”; (3) deficiências de tradução do Hebraico e do Grego para outras línguas; (4) a própria natureza divina da Bíblia, que traz seus mistérios (inexplicáveis), nas áreas relativas à profecia, aos milagres e à algumas doutrinas relacionadas à pessoa de Deus (tal como a Trindade).
Enfim, nós cristãos cremos que o Espírito Santo inspirou, orientou e supervisionou os escritores bíblicos para que eles escrevessem o que Deus queria nos revelar, principalmente quanto à sua pessoa (de Deus), seu Reino, a origem e o futuro da vida, a essência da alma humana e o relacionamento entre o homem e Deus. Nisto, a Bíblia é verdadeira, inerrante e não há fonte nem autoridade maior do que ela.
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Perguntas para reflexão e aprofundamento:
- É comum ouvirmos que “o artista estava inspirado”. A inspiração bíblica pode ser entendida neste sentido?
- Você concorda com o ditado popular “Deus escreve certo por linhas tortas”?
- Porque devemos ter cuidado para não “canonizar” pessoas, tradições e costumes ou instituições?
- Ouvi pessoalmente um professor de um seminário teológico evangélico ensinar que os homens que escreveram a Bíblia (por inspiração divina) transmitiram idéias erradas sobre o universo e a terra, porque eram as idéias correntes em suas épocas. Afirmou ele que devemos ler a Bíblia para retirar princípios e que quase nada nela é literal. Aquele professor afirmava crer que a Bíblia foi inspirada por Deus, mas, entende que os homens que a escreveram “expressaram suas próprias opiniões científicas” ou “não entenderam muito bem o que Deus disse quando falava sobre ciência”. E foi mais longe: afirmou que os escritores bíblicos escreveram idéias e “estórias” sobre Deus, que por sua vez, lhes foram passadas verbalmente pelos seus antepassados. Assim foi a “inspiração divina”, para aquele professor e para muitas pessoas hoje em dia. O que você acha disso? O que, na sua opinião acontecerá na vida prática de alguém, quando esta pessoa começar a pensar como aquele professor?
- Como o Senhor Jesus e os escritores do Novo Testamento tratavam o Velho Testamento? Como livros com autoridade divina ou livros puramente humanos? (veja Mat. 1.22; 2.15; 4.4-11; 15.4; 19.4; 22.43; Marcos 1.44; 2.25; Lucas 6.26; 11.51; 17.26; João 6.31; 8;56; 1 Tim. 5.18). Jesus e os apóstolos consideravam os fatos por eles citados como História ou como estórias? Para eles os personagens citados do Antigo Testamento eram imaginários, e suas palavras eram imaginárias ou eram pessoas reais, que realmente falaram o que foi registrado no Velho Testamento?
- O que muda em nossas vidas práticas, quando aceitamos que a Bíblia foi inspirada por Deus e é inerrante?
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